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26 de Abril de 2024
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    Leis Fundamentais do Maranhão completam 400 anos

    há 11 anos

    São Luís não passava de um povoado e não contava com dois meses da data oficial de fundação, quando foram promulgadas, em 1º de novembro de 1612, as primeiras normas jurídicas em terras maranhenses: as Leis Fundamentais do Maranhão, que, também completam 400 anos no ano da passagem do aniversário da cidade.

    O mapa do mundo terras descobertas e a descobrir - estava dividido entre as posses dos reis da Espanha e de Portugal, conforme o Tratado de Tordesilhas. Mas os residentes na ilha Upaon-Açu dos índios Tupinambás, estavam sob o jugoda coroa francesa, que invadiu a costa norte do Brasil e fundou a França Equinocial, cujos domínios se estendiam até 50 léguas (cerca de 350Km) em torno do forte construído à beira do mar hoje Palácio dos Leões.

    Em homenagem ao infante Luís XIII, Rei de França e Navarra, que contava 11 anos de idade, o chefe da expedição e fundador, Daniel de La Touche, senhor de La Ravardière, batizara com o nome do rei menino o forte Saint-Louis, dando origem à povoação.

    Naquela época, o Brasil-Colônia estava sob o domínio português e passava por sua segunda fase de organização judiciária, entre os anos de 1549 a 1767, com o poder centralizado nos governadores-gerais. O código legal vigente na época eram as Ordenações Filipinas, instituídas em 1603 por Filipe I, rei de Portugal, que vigoraram até 1830. O sistema de administração das terras pelos donatários das Capitanias Hereditárias não prosperou a contento e o território português permanecia vulnerável à ação dos invasores ingleses, franceses e holandeses, que não foram beneficiados pelo Tratado de Tordesilhas.

    A França Equinocial foi a segunda tentativa de os franceses estabelecerem bases no litoral brasileiro, com planos de expandir seus territórios e difundir o catolicismo, com apoio dos nativos. A lei servia de instrumento de consolidação dessas conquistas e suporte legal aos exploradores.

    O costume era que os conquistadores já trouxessem de suas origens a legislação a ser aplicada nas colônias. Era comum receberam uma carta régia, que lhes concedia direitos para praticar atos na colônia, incluindo competências cíveis e criminais. No entanto, no caso das Leis Fundamentais, que originaram a França Equinocial, foram adaptadas à cultura local.

    Assinadas por Daniel de La Touche e François de Rasilly, as normas foram disseminadas por meio de pregões aos silvícolas, fidalgos, militares e religiosos e a todos subordinava. Eram constituídas de um compêndio de normas de várias espécies, que incluía direito canônico, penal e civil, dentre outros ramos do Direito e previa duras penas para os infratores.

    Dizia, dentre outros preceitos, que seria punido quem atentasse contra a vida do comandante da expedição ou dos residentes na Colônia, tipificando crimes de homicídio, parricídio, traição, atentado e monopólio, sob pena de condenação à morte, sem perdão. Só escapava da morte o homicida que agisse, justificadamente, em legítima defesa.

    O crime de furto era punido com detalhes curiosos: açoites ao pé da força, ao som de corneta, para servir de exemplo, cumulada com trabalhos forçados nas obras públicas, com a perda da dignidade e dos salários correspondentes aos serviços executados. Se o réu reincidisse, enforcamento.

    ADULTÉRIO - Junto com as primeiras normas, também foi instituído o Corpo de Justiça. Funcionava como um tribunal informal. Foi com base nessa legislação e seus agentes, membros dessa corte improvisada, que se fez o primeiro julgamento de um crime que abalou a colônia: a bárbara execução da esposa do índio Japiaçu, chefe da aldeia Junipará, por adultério.

    O desembargador e historiador Milson Coutinho, reproduz com detalhes a passagem desse julgamento no livro História do Tribunal de Justiça do Maranhão (Colônia, Império República), baseado em citações de terceiros do relato do padre dAbbeville, escrivão da expedição.

    Narra o magistrado que, ao tomar conhecimento da lei, o silvícola a utilizou a seu favor, por sua conta e risco. Ao saber por seus filhos que a esposa havia praticado adultério, fez justiça com as próprias mãos, ordenou a morte dela por esquartejamento, pelas mãos das índias mais velhas da aldeia.

    Pela prática do crime, foi levado a responder a um processo sumário e oral diante do conselho, formado por fidalgos e chefes indígenas. De sorte que, por deliberação, do presidente, François de Rasilly, obteve a absolvição. Não somente pela aquiescência e generosidade dos seus julgadores, diz-se, mas pela articulada defesa que fez de si próprio.

    Pela promulgação das leis fundamentais e criação de um Corpo de Justiça, Coutinho considera Luiz XIII, em teoria, o primeiro chefe supremo do Judiciário do Maranhão, título que lhe conferiu em outra obra de sua lavra: Ouvidores-Gerais e Juízes de Fora. Livro Negro da Justiça Colonial do Maranhão (1612-1812).

    A dominação francesa e as Leis Fundamentais vigoraram até 3 de novembro de 1619, data registrada na história como o dia da rendição dos invasores na capital, após a vitoriosa batalha contra os invasores pelos portugueses Jerônimo de Albuquerque, em terra, e Alexandre de Moura, no mar.

    Sete dias depois daquela data, e sete anos após a fundação de São Luís, fora criada a Ouvidoria Geral do Estado do Maranhão, a segunda do Brasil, outorgada por ordem do Rei Felipe III da Espanha (IV de Portugal). Era o primeiro ordenamento jurídico lusitano no Estado do Maranhão.

    HISTÓRIA DA JUSTIÇA - Situada a promulgação das Leis Fundamentais do Maranhão na história de São Luís, pergunta-se: qual a contribuição dos franceses e de suas normas fundamentais para a história das leis e da Justiça?

    O doutor em Direito do Estado, José Cláudio Pavão Santana, atribui às Leis Fundamentais do Maranhão valor constituinte, na tese defendida junto à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, intitulada As Leis Fundamentais do Maranhão: Densidade Jurídica e Valor Constituinte. A contribuição da França Equinocial ao Constitucionalismo Americano. A pesquisa foi publicada no livro O Pré-constitucionalismo na América, lançado em 2010, onde a natureza das normas é analisada sob os aspectos cronológico, territorial e normativo.

    Segundo o professor, com as Leis Fundamentais, os franceses contribuíram significativamente com o estudo do Direito Constitucional, considerando que houve na história o pré-constitucionalismo, compreendido como o estudo da formação do Estado Constitucional, em época anterior ao século XVIII.

    O autor constata que as bases das normas revelam preocupações que mais tarde foram assentadas em cartas constitucionais, inclusive a Constituição da República de 1988. E assegura que as LFM precedem todas as normas escritas no continente americano que tenham por propósito a constituição de um Estado. Nem mesmo a Declaração de Mayflower , (11 de novembro de 1620), fundamento da primeira constituição das Américas, as antecedeu.

    Conforme a tese, a singularidade das LFM, que a diferenciam das demais, reside na sua concepção e formalização. Todas as leis que chegavam às colônias na América chegavam, prontas, emanadas das coroas. As Leis Fundamentais foram concebidas, escritas e publicadas aqui. Minha pesquisa mostra que os franceses se reuniram com os índios nas aldeias, em volta do fogo, e depois fizeram um contrato entre eles, afirma.

    A formação normativa é outro aspecto levantado pelo pesquisador: O que é interessante destacar é que muito do que está escrito hoje em todas as constituições do mundo contemporâneo já estava previsto nas Leis Fundamentais. Exemplos: a integridade moral e física da mulher, a pena de morte, o açoite, o sossego público e o tributo, que foram conquistas do Estado moderno, afirma doutor Santana.

    Que se saiba, nas três Américas Central, do Norte e Sul as Leis Fundamentais do Maranhão foram as primeiras com esse caráter constitucional publicadas em nosso hemisfério, arremata o magistrado Milson Coutinho.

    Controvérsias à parte acerca do pioneirismo das normas constitucionais, e até mesmo acerca da fundação de São Luís, o fato é que a instituição das Leis Fundamentais está, íntima e definitivamente, ligada, no tempo e na história, ao Poder Judiciário no Maranhão.

    Helena Barbosa

    Assessoria de Comunicação asscom@tjma.jus.br

    2106-9024

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